21 de abr. de 2008

Saudades de Mértola





um naco de pão, um pouco de água fresca,


a sombra de uma árvore e os teus olhos.


Nenhum sultão me excede em alegria,
nenhum mendigo é mais triste.



Omar Khayyam



Nesta viagem, sempre mais para o Sul convido-vos a seguir a estrada entre Évora e Beja, depois de um dia na universidade na subtil cidade manuelina-mudejar a falar sobre a poesia luso-árabe e a percorrer a excelente e única biblioteca do Centro de Estudos Árabes, dirigida pelo Prof. Abel Sidarus, na companhia do prof. Fernando Branco, colega no painel da manhã e com quem haviamos estado há sete anos a apresentar, em Mértola, o número zero, experimental, ainda em fotocópia, da revista Memória Alentejana... e estamos de novo na estrada, o Sol, iniciou o seu deitar, a estrada é secretamente percorrida com serenidade, não em desvario como aquela personagem dum conto do Prémio Literário Pedro Ferro em fiz parte do júri. Sereno, sem pressa, aprecio a suave beleza do horizonte, o Sol que continua a esconder-se. Há um programa na rádio, antena 3, sobre viagens. Falam de como é Alentejo é particular e único. Se estivessem onde eu estou...o Sol mesmo quase a pôr-se inevitavelmente...




É noite quando chego a Mértola. Para além de um bar em plena cidadela onde adolescentes bebem cerveja não se vê vivalma. Percorro as ruelas empedradas, as pedras segredam-me as histórias de Vidas e Amores, traições e lutas, de preserverança no caminho a seguir... volto na noite seguinte depois de um longo percurso a pé em redor da barragem em S. Domingos e de uma ida a saboerar o silêncio de um fim de dia no Pomarão, volto nessa noite e vou ao castelo, à mesquita, encontro-me com o Ibn Qasî, o mestre sufi, o guerreiro, o asceta, o diplomata... as pedras contam-me histórias, ali naquela encosta de ruelas estreitas onde o souk se instala quando acontece o Festival Islâmico...







Há tanto tempo que esperava por aquele silêncio, de me sentar na soleira da porta, fumando, esperando... tinha saudades, saudades dos campos pintados por mão divina, percorridos no dia seguinte a caminho da Aldeia de Sete, onde o jovem Mestre de apenas 24 anos, o Pedro Mestre, no silêncio da tarde me mostrou no seu atelier uma voila campaniça, por ele reconstruída e dedilhou aqueles sonoridades únicas destas paragens ao Sul, bem ao Sul do Alentejo...



tinha saudades de ficar só com este silêncio...

tinha ...

saudades de Mértola




10 de abr. de 2008

Al Mouhatamid ou o Amor ... e o Mar

Em breve vai ser dia. Entretanto a tempestade há muito anunciada chegou.
Estou exausto.
Recordo a estada breve no Moinho das Mestras, no Rio Degebe, com o amigo Ludgero Salvador, o Ganhão-mor da Confraria da Moenga, o Augusto, os outros amigos. Gostava de ser confrade. e os outros amigos, do Grupo Coral "Os Almocreves", o presidente da Associação "Slow food", que têm como símbolo um caracol, o autarca José Ernesto, ou o Mestre Salgueiro, que no regresso deixei em casa.

Recordo a Serra da Arrábida no dia seguinte, o Convento dos Capuchos propriedade da Fundação Oriente e aquela capela, semelhante a um antigo morábito?, azul magrebino, sobre o mar do Portinho onde fiquei e ver o findar do dia encontrando as palavras certas, que depois surgiram em catadupa, mais de 15 áginas, em poucas noites quase em claro.


A tempestade continua escondendo o Mar da Palha.
O dia vai nascer em breve.
Estou exausto. Mas contente. Revigorado. Renovado. Encontrei caminhos belos e novos na História e na Poesia do "Século de al Mouhatamid"...


... dentro de poucas horas parto para Évora - e depois, quem sabe, bem mais para Sul..., -onde vou participar no Congresso da APEC- Associação portuguesa dec Estudos Clássicos, com uma comunicação que começa assim - apectece-me partilha-la agora, que exausto, a terminei:


O Amor, O vinho, a Natureza e a Saudade na Poesia Luso–Árabe

«Admiro este Mouro que não defende a liberdade porque no deserto se é sempre livre, que não defende tesouros visíveis porque o deserto é nu, mas que defende um reino secreto»



Saint-Exupéry citado por Adalberto Alves em O meu Coração é Árabe


Quero falar-vos de um reino secreto. De Poesia vos quero falar. De um reino secreto que existiu e atingiu a sua plenitude no coração de homens e mulheres que viveram no “século de Al Mouhatamid”.


e.. termina...
Em Al Mouhatamid (e nos poetas exemplificados) na sua lírica radica vão beber D. Dinis, Camões, chegando até aos nossos dias, com Sophia, Alegre e todos os poetas e escritores de canções que cantam o Amor, a sensualidade, a Paixão, a Natureza, a Saudade do ser português, como pretendemos mostrar com um trabalho em curso.

Al Mouhatamid, que personificando tudo isso, essa nossa génese poética, mas também o estadista visionário, que teve continuidade em D. João II, mas ele," Poeta do Destino" encontrou o desterro e a morte em terras magrebinas como D.Sebastião, ele que foi, sobretudo, o Príncipe do Renascimento, Amante e Rei, no dizer de Adalberto Alves, que citamos: (de novo)

A nossa poesia trovadoresca, quer as cantigas de amigo quer as de amor, quer as de escárnio e mal-dizer, são filhas directas das muwashshaha, e do zajal árabes. E a saudade, palavra indizível, a não ser em português e árabe, é cantada já no «nasib» da velha ode «qasida» ante-islâmica. Essa saudade é a mesma que os habitantes de Testou (Tunísia), Tlemcen (Argélia) ou Tetuão (Marrocos) sentem da terra do verde e da água, o Ândalus, de onde injustamente foram expulsos há quatro séculos. Talvez por isso, ainda hoje usem os seus apelidos portugueses e espanhóis, e têm penduradas, nas paredes dos lugares que habitam, velhas chaves ferrujentas das casas que aqui foram forçados a abandonar”



Deste arabista e poeta vos deixou, do seu muito recente último livro - No Vértice da Noite- que muito me agradou.. .e ainda estou saboreando,




Tu e o Mar


em ti arfa um mar

que afaga a praia sob a bruma.




há sopro e expansão

e voo de asas só de espuma.




primeiro, ondulação serena

e logo vagas, vertigem de maré.


todo o teu rosto esplende

és sibila que não sei quem é.


depois murmúrio de palavras roucas

num mistério que nos morde as bocas.


31 de mar. de 2008

O Encontro

Depois de uma longa viagem pelos lugares do Sul, regresso… regresso exultante dos cheiros, dos sabores, do silêncio, da descoberta, da amizade…
Em quase10 dias percorri alguns dos lugares mais perenes e secretos do Sul: Silves, a cisterna da Moura Encantada e a antiga mesquita de Santa Maria de Faro ou as ruas e ruelas de Tavira onde apreciei o peixe ao luar naquela terra suave que foi Comuna de Pescadores no período derradeiro das terceiras Taifas. Depois a estrada deslizante entre as serranias, deixando a ponte do Guadiana e Huelva para trás, à direita. E, já depois de ter passado a saída para Alcoutim, surge uma tabuleta à esquerda: Mesquita. Travo leve, ligeiro, subtil como os barcos que há mil anos subiam o rio e percorro uma estrada estreita que me leva a uma pequena aldeia perdida nas serras, já não muito longe do Guadiana. Contemple-a, percorro-a e começo a descer uma estrada de terra batida; perco-me nos campos sorvendo a plenos pulmões o odor e a luz das estevas – papoilas de estevas, chamou-lhe o Adelino, e ele sabe do que está a falar, ele que foi pastor e manteve ao longo dos anos essa ligação e serenidade que a Terra e as noites passadas debaixo da Lua nos dá – fico ali, embebedando-me de silêncio… a tal ponto que esqueço as horas, mas como há males que veem por bem, de repente vejo-me em Mértola a comer queijo com pão e a beber vinho na única mesa da esplanada de uma tasca onde não ia à muito.



Tenho o castelo defronte, a poucos metros o amigo arqueólogo Jorge Feio coordena uma escavação. São quatro da tarde, o Sol aquece-me o corpo depois de uma manhã em que as nuvens teimavam em tapar o céu, estou num dos lugares mais bonitos do mundo, e… de repente surge, quase cambaleante o velho pintor-filósofo Mário Elias que se senta comigo e… me fala de ópera, de canto lírico, dá exemplos e… eu recordo-lhe como cantou no 3º aniversário do CEDA e na Evocação de Pedro Ferro, na “Cavalariça”, em Entradas, foi a… 18 de Maio, momento que ficou registado na Memória Alentejana assim:

“E com as cordas vocais afinadas pelo poejo verde alguns sócios fizeram a evocação dos cantares do nosso Alentejo. Mas a arte foi de Mário Elias. Que tenor!”.

Um regresso a casa… sentado, fumando, à soleira da porta, esperando!...


Depois de um fim de tarde na Biblioteca de Beja em busca da memória de Al Mouhatamid Ibn Abbad janto com o amigo antropólogo e poeta José Orta, falamos de poesia e de novos projectos e faça-me de novo à estrada…

No dia seguinte visito apiários com o meu amigo Alex Pirata, tenho uma visão e na manhã do outro dia seguinte encontro a Nina, a sua simpática esposa - agora a atravessar um momento difícil – com quem tomo o pequeno-almoço. A Páscoa aproxima-se, e passo a tarde desse dia em companhia do Mestre das plantas, o jovem José Salgueiro, com apenas 89 anos, a identificar plantas nas margens do rio Almansor, ali para os lados da Barragem dos Minutos e … percorro os montes com o sr. Isidro Rebocho, apicultor e proprietário de uma melaria, preparando “o terreno” para um passeio em Maio.




O dia seguinte é o Dia Mundial da Poesia. Falo e ofereço poesia. Aos amigos. Ao Manel Casa Branca, à Ana, que ficou maravilhada e divulga a todos os comensais o exemplar de Flores da Planície que lhe ofereci, e ao anoitecer vou-me abastecer de mel e de afectos enquanto saboreio aquele licor de poejo único que só o Alex tem.

No sábado parto a caminho do Pomarão. Em Ferreira, encontro a Céu e a Marta, que com o seu vigor de oito anos passa a viagem a jogar à sardinha comigo. Aquele visão única do último porto do Mediterrânico surge de repente e elas ficam boquiabertas e percebem porque valeu a pena a viagem. E depois foi saborear os peixes do rio: a lampreia, as enguias, o bom vinho branco... e o reencontro com a Guika e outros amigos.


No regresso, ao parar frente ao Café Guadiana, e depois vislumbrando a Mesquita no caminho empedrado para a Torre do Relógio recordo o abraço que o Mestre Amigo Cláudio Torres me mandou pesaroso por não estar para almoçarmos e… navego até mais ao Sul, lugares secretos Tânger, Marraquexe –de que nos fala demoradamente o Amigo Cônsul José Alberto Alegria - para onde ele vai no dia seguinte onde tem a sua casa de férias -naquela agradável encontro no domingo anterior no seu atelier de arquitectura – Darquiterra - em Albufeira.


Navego para Sul, no tempo: Beja, Silves, Sevilha, Tânger, Rhmat… regresso de novo a Silves.. é um dia suave de fim de tarde, todavia frio e com vento. Dois homens esbeltos passeiam nas margens do rio, um mais jovem… o seu ar exterior elegante revela uma condição nobre. De repente o mais jovem, olha para o céu e depois para o rio, para as suas águas encrespadas pelo vento frio e diz ao outro, esperando a resposta:

O vento converte as águas
numa cota de malha…

mal decorre uma breve facção de segundo ouve-se uma voz doce, muito doce:

e que é cota de armas
quando o frio a congela!

uma jovem bela, muito bela, de cabelos negros-vermelhos, com leves fios vermelhos, surge de repente. A sua pele é macia, muito macia e clara, a sua boca é uma romã e o seu olhar é um clarão vindo do início dos tempos, os seus olhos são lâmpadas de Aladino que fixam o jovem senhor olhos nos olhos…


O jovem Príncipe treme e… o seu rosto abre-se num sorriso de plena felicidade. Olham-se demoradamente. Felizes, encantados os dois. O Encontro do seu olhar ilumina o fim de tarde, pára o vento, aquece o ar frio e ilumina toda a cidade, o rio, o Palácio dos Balcões, o castelo avermelhado, até ao horizonte.

Ibn ‘Ammâr surpreendido e inquieto pela intrumissão pergunta-lhe:

Que tendes senhor?

Mas ele não o ouve. Apenas vê a jovem, linda. E é a ela que se dirige:

És tão linda…como te chamas?

I’timad senhor…

Princesa I’timad… diz-lhe encantado




Nesta minha viagem interior não me dei conta que estava às portas de Beja… e regressei de novo a Silves, ao rio Arade… talvez depois Sevilha… Tânger…

15 de mar. de 2008

8 de Março : O Poder do Amor

Depois de um Fevereiro sombrio regressamos já um meados de Março, mês que anuncia a Primavera e a Poesia nos campos e nas tertúlias, mês sombrio este passado se bem que os campos se tivessem começado já a florir... até de papoilas,todavia mês sombrio. E, enquanto nos campos se anunciava já o regresso das andorinhas e o sabor das cores da Primavera antecipada, assistimos a diversas realizações citadinas, com temas tão diversos como os "100 anos do Regícidio", ou de como um Alentejano matou outro no Terreiro do Paço, digoeu, e estou-me a referir a Alfredo Costa, natural de uma aldeia, que agora não me ocorre o nome, no Concelho de Castro Verde - a quem o Amigo Paulo Barriga dedicou um livro e, claro a Carlos de Bragança, como o meu Amigo Manel (Casa Branca) gosta de designar o rei D. Carlos, por sinal um excelente pintor, talvez o maior dum determinado período do seu tempo e isto não sou eu que o digo ou até o próprio Manel, é o decáno dos Historiadores de Arte, o Prof. José Augusto França - a quem eu tive o prazer de assistir ainda a aulas/conferências na FCSH da Nova. Teve o azar de ser rei... isto, claro não deixando de ter presente todo o processo histórico importantíssimo daqueles primeiros e conturbados anos do início do séc. passado, os pensadores, as lutas civícas, mentais e... sociais - já lá vão alguns anos, uns 14 ou 15, fiz até um trabalho no final da licenciatura sobre o movimento operário nos 2 primeiros anos da República: as greves dos conserveiros em Setúbal, em inícios de 1911 e a das assalariados rurais Alentejanos em Évora, nesse ano, com repercussões até ao seguinte - nessa bela cidade onde chegaram a estar 50 mil grevistas com a cidade cercada pela tropa... cidade onde em 1996, salvo erro, apresentei uma comunicação no Congresso do Alentejo sobre este assunto... como tanta coisa mudou... no mundo e no meu mundo desde pouco mais de escassos 10 anos...



E... chegámos ao dia 8 de Março, nesse dia em que se manifestaram 100 mil pessoas em defesa da DIGNIDADE dos professores deste país. Por razões familiares não estive lá, mais estive de alma e coração com a classe docente, que desde o básico ao superior tem excelentes, EXCELENTES e DEDICADOS profissionais, e sei do que estou a falar pois alguns dos meus amigos mais próximos são professores - o meu maior amigo de infância , o Mário João é director duma escola, a EB 123 de Penafiel, o Naia, o Ramos, para só citar mais dois casos, vivi quase 20 anos com uma prof. a Isabel e... afinal eu também como docente já passei por quase todos os graus de ensino - desde o Educação de Adultos-Alfabetização, o Ciclo Preparatório, o Secundário, o Superior, tudo somado faz quase 10 anos lectivos.. embora de momento não esteja a exercer tenho um grande respeito pelos professores deste país e, claro, estou solidário com a sua justa luta!


Mas, o dia 8 de Março é também o Dia da Mulher - que há um ano foi passado, como então dei conta neste blog, eu e a minha Amiga Natália, o dia inteiro na companhia do Mestre e Amigo Cláudio Torres na suave Vila de Mértola.

E deixem-me ser agora "politicamente incorrecto" como aliás sou por natureza e opção...

Deixo-vos um muito belo poema de um dos maiores poetas nascido na Pátria Alentejana e o maior nascido em Beja: Al Mouhatamid Ibn Abbad. Intitula-se Poder... ou não será no Amor que reside o maior de todos os poderes?

Por ocasião do Dia da Mulher - que passou recentemente - uma breve mas poderosa Homenagem que dedico à Mulher que Amo apaixonadamente!


meu olfacto é teu odor delicioso

e o teu rosto o senhor dos olhos meus,

por seres minha, mesmo depois do adeus,

é que todos me chamam poderoso.

28 de jan. de 2008

el duende



de um disco lindo, Suerte, de Abed Azrié, não posso deixar de partilhar alguns excertos de um belo texto de Federico García Lorca, o grande poeta Granadino, escrito em Havana, em 1930... mas tão actual... como a beleza da sua arte

"Eso tiene duende"

«Manuel Torre, gran artista del pueblo andaluz, decia a uno que cantaba: " Tú tienes voz, tú sabes los estilos, pero no triunfarás nunca, porque tú no tienes duende."
En toda Andalucía, roca de Jaén o caracola de Cádiz, la gente habla constatemente del duendey lo descubre en cuanto sale con instinto eficaz. El maravilloso cantaor El Lebrijano, creado de la Debla decía: " Los cías que uo canto com duende no hay quien pueda conmigo", la vieja bailarina gitana La malena exclamó um día oyendo tocar a Brailowsky un fragmento de Bach:
" Olé! Eso tiene duende!"
Todos los artes son capaces de duende, pero donde encuentre más campo, como es natural, es en la música, ena la danza y en la poesía hablada, ya que estas necesitan un cuerpo vivo que interprete, p0orque son formas que nacen y mueren de modo perpetuo y alzan sus contornos sobre un presente exacto.»

E mais à frente diz escreve Federico:

«En toda la música árabe, danza, canción o elegía, la llegada del duende es saludada con enérgicos "Alá, Alá"! "Dios, Dios", tan certo del Olé! de los toros, que quién sabe si será lo mismo; y en todos los cantos sel sur de España la aparición del duende es seguida por sinceros gritos de "Viva Dios", profund, humano, tierno grito de una comunicación con Dios por medio de los cinco sentidos. »

citando depois um velho mestre guitarrista:

"El duende no está en la garganta, el duende sabe por dentro desde la planta de los pies"

"Este "poder misterioso que todos sienten y que ningún filósofo explica", es, en suma, el espíritu de la tierra.
"Aquí no nos importan las facultades, ni la maestría. Nos importa otra cosa"

como disseram um dia quando «la cantaora andaluza Pastora Pavón, La Niña de los Peines, sombrío genio hispánico, equivalente en capacidad de fantasía a Goya o a Rafael el Gallo, cantaba en una tabernilla de Cádiz»


em que os ouvintes permaneciam calados


«Entonces La Niña de los Peines se levantó como una loca, tronchada igual que una llorona medieval, y se bebió de un trago un gran vaso de cazalla como fuego, y se sentó a cantar sin voz, sin aliento, sin matices, con la garganta abrasada, pero... con duende.

La Niña de los Peines tuvo de desgarrar su voz porque sabía que la estaba oyendo gente exquisita que no pedía formas, sino tuétano de formas, música pura con el cuerpo sucinto para poderse mantener en el aire. Se tuvo que empobrecer de faculdates y de seguridades; es decir, tuvo que alejar a su musa y quedarse desamparada, que su duende viniera y se dignara luchar a brazo partido Y cómo cantó! Su voz ya no jugba, su voz era un chorro de sangre digna por su dolor y su sinceridad.»




neste tempo de materialismo tão usurpador, de racionalismo tão violento... o espaço para a alma, para os sentimentos, o espaço autêntico da Vida...!









31 de dez. de 2007

A Mina do Lousal... e a renovação da VIDA!...


No dia 15 de Dezembro aconteceu em diversos espaços - no auditório, no museu, no restaurante, etc - um conjunto de iniciativas no âmbito do lançamento da Revista Memória Alentejana - nº duplo 21/22, com dois cadernos temáticos, respectivamente sobre as Minas do Alentejo e sobre os Cantores de Intevenção. Houve visionamento de imagens das Minas nos anos 50, relatos de histórias de vida de antigos mineiros - a cargo da socióloga Paula Rodrigues, autora da obra Vidas na Mina Memórias, Percursos e Identidades. Houve a visita ao Museu guiada pelo Dr. Fernando Fantasia, administrador da Fundação Frederic Velge e da SAPEC, e pelo Manuel João, antigo mineiro, filho e neto de mineiros, e grande animador do grupo coral local. Houve poesia popular pelo poeta José Carrilho Raposo. Houve diversos intervenções informais e fraternas e... terminou com um excelente recital de música e poesia, com a participação do Amigo de sempre Francisco Naia e do excelente diseur, o juiz e antigo actor Jorge Lino, que nos deliciou, entre outros, com um magnifico "Sermão aos peixes" do Padre António Vieira, recital que teve ainda a participação do escritor e poeta grandolense Costa Neves. Foi tão bonito ao ponto de a Nédia, esposa do companheiro Rogério de Brito , Presidente da MAG do CEDA , afirmar que nunca tinha assistido a uma sessão com um grau de interacção como esta no CEDA... nos não iriamos tão longe, houve outras, nesta ou provavelmente noutras áreas... mas ficamos contentes por se ter proporcionado momentos tão verdadeiros... a todos um grande abraço: aos amigos já referidos e tambem à Natália Nunes, ao Domigos Montemor, ao César Pires, ao José Matias, ao Luís Ferreira e.. a todos os presentes...















































































































Maria Sol de madrugada Flor de tangerina

Maria
Nascida no monte
À beira da estrada
Maria
Bebida na fonte
Nas ervas criada

É muito bonito este poema. É do Zeca. O Zeca gravou-o no disco “Cantares de José Afonso”, o EP que saiu em 1964. Um disco que fala do encontro do Zeca com o Sul. Um disco que fala do encontro do Zeca com o Amor. Um disco onde o quatros temas são da autoria do Zeca, letra e música. Onde encontramos a “Canção do Mar” ou “Ó vila de Olhão”. Sobre o Sul, sobre o Amor o Zeca escreveu:
“o conhecimento da Zélia, num lugar do Algarve, reconciliou-me com a água fresca e com os tons maiores. Passei a fazer canções maiores.”
Nesse mesmo ano o Zeca veio a Grândola cantar. Foi na “Sociedade Musical Fraternidade Operária Grandolense”. Fê-lo a convite de seu amigo Hélder Costa, como este nos dá conta nestas páginas, num belo fresco da memória onde nos relata esse encontro do Zeca com Grândola, encontro que terá estado na origem do tema que depois foi a senha da revolução do 25 de Abril. Desse encontro com a “Vila Morena”, o génio maior da música popular portuguesa e mundial diz-nos também desta forma apaixonada:
“(…) e então fiquei extremamente impressionado com a colectividade: num local quase sem estruturas nenhumas com uma biblioteca de evidentes objectivos revolucionários, uma disciplina generalizada e aceite entre todos os membros, o que revelava já uma consciência e maturidade políticas”.
Talvez
Que Maria se espante
De ser tão louvada
Mas não
Quem por ela se prende
De a ver tão prendada

Mas o Zeca esteve também em Aljustrel, a vila mineira, como nos relata Francisco Naia, ao tempo aluno do liceu local, onde teve um professor diferente que falava aos alunos da dignidade e confraternizava com ele cantando fados e baladas de Coimbra. O Zeca, que soube aprender com os mais humildes, com o “pão que o diabo amassou”, nestas suas andanças de professor, antes da sua tomada de consciência social e política última, que se terá dado durante a sua estada em Moçambique. Popular e querido do povo, este vem em peso despedir-se do professor humano, humilde e fraterno à estação do comboio, momento protagonizado pelo pai do Naia, o chefe Tonicher. (…)
Maria
De todas primeira
De todas menina
Maria
Soubera a cigana
Ler a tua sina

O Zeca manteve a sua relação, inclusive física com Grândola e percorreu o Alentejo e lés a lés a cantar, nomeadamente durante o PREC.
“(…)Recordo-me de experiências extraordinárias vividas com o Francisco Fanhais, com o Vitorino e tantos outros companheiros por estas aldeias fora, em terras em que a população se juntava para resolver o problema da escola, para calcetar as ruas, resolver directamente o problema da higiene(…)”
o Zeca que terá cantado a “Grândola” pela primeira vez num recital em 10 de Maio de 1972, em Santiago de Compostela, o que não estava previsto, mas entusiasmou-se e aconteceu, como outra vez que tanto se emocionou num recital para mineiros asturianos, como refere Benedicto García Villar.
Não sei
Se deveras se engana
Quem demais se afina
Maria

Zeca Afonso, homem livre e liberto, fraterno e solidário com os humilhados e com os perseguidos. O Zeca, o poeta. Zeca aqui justamente recordado na Memória Alentejana, e também o Adriano, seu companheiro de canto, de postura e de dignidade, ambos com o poeta Alegre e o Luís Cília, percursores desse movimento bonito e tão importante que foi o Canto de Intervenção. Nesta edição onde são tema com as minas do Alentejo – Aljustrel, S. Domingos, Neves-Corvo, Lousal –, e onde se publica um estado de um investigador brasileiro sobre Florbela – continuando o CEDA a expandir-se e a chegar assim à América Latina. Neste número, onde se dá conta das actividades do CEDA, nomeadamente em terras de Montemaior - na Herdade do Freixo do Meio, à arte do Sobreiro pelo amigo pintor Casa Branca guiada, ou o percurso inesquecível pelo mel, rio, moinho do Ananil, ferrovia, e vinho de Plansel registado em palavras mas sobretudo imagens, belas, pelo Alex Pirata, amigo apicultor. E os livros, muitos, tantos, que nos chegam, que encontramos, e os discos e os acontecimentos, sempre mais, a revista a aumentar o número de páginas.
E ainda parafraseando o Zeca ...
“(…)Toda a perspectiva progressista é compatível com os aspectos conservadores da cultura que se pretende conservar(…)”
A defesa das nossas tradições, nomeadamente as gastronómicas, e a conservação dos espaços de convívio dos nossas cantadores, as tabernas, espaços ritualizados que é preciso preservar, assim como a forma peculiar de confeccionar os alimentos e os utensílios usados, os fornos de lenha; tudo o que nos dá o sabor único da nossa gastronomia, da nossa doçaria, que é preciso preservar com dignidade face a ventos algo fundamentalistas e adulterações várias, que sobre ela por vezes se abate. Porque há que saber que o futuro, o desenvolvimento do Alentejo está no encontro da tradição com a modernidade, como aliás acontece na Mina do Lousal, onde este edição será lançada, apresentada, nesta Mina renascida, onde a par da tradição mineira e sua paisagem surge uma centro de ciência viva, espaço cientifico único em Portugal.
Este é o caminho...

Maria
Sol da madrugada
Flor de tangerina


























2007 despede-se marcado pelo horrível assassinato de Benazir Bhutto...

































Não sabemos se o ano de 2008 será melhor... com menos guerras, com menos ódio, com menos fundamentalismos....





Sabemos, todavia, neste momento de renovação da Vida - dentro de cerca de duas horas começa o novo ano -porque de fim e de princípio, de noite e dia, de escuridão e luz se trata como os povos antigos o viam e sabiam - sabemos que daremos a nossa singela e desprentensiosa mas rigorosa participação para melhorar, porque seremos melhores amanhã do que ontem, seremos mais fraternos e mais justos, mais fortes e mais poderosos, com maior capacidade de Amar e ser Amados, com maior certeza que a Felicidade existe!...
Neste Mar que nos dá serenidade, paz e nos revigora encontraremos a Luz para o caminho!...




16 de dez. de 2007

por Amor ao Alentejo



Uma rosa para Florbela



Depois de uma lamentável avaria informática, regressamos…


Regressamos de
Vila Viçosa, onde no dia 25 de Novembro estivemos no lançamento da Revista Callipole, nº 15, sessão bonita, no último dia das IV Jornadas de Património. Respondendo ao caloroso convite da Autarquia Calipolense transmitido em Badajoz pelo excelente dinamizador cultural, o amigo Licínio Lampreia, revimos velhos amigos: os autarcas, o presidente da edilidade, Manuel Condenado, o Vereador da Cultura, Joaquim Viegas, o director da publicação Joaquim Saial, o editor Fernado Mão de Ferro, e… entre callipolenses com quem nos temos cruzado e confraternizado em anos anteriores… a pintora e poetisa Leolinda Carvalho… com quem falamos de fotografia…
E visitamos Florbela…
Um rosa deixámos…
Nesse dia… pensando em 8 de Dezembro, dia de morte e nascimento!...

Nesse outro dia estávamos a percorrer a planície entre Évora e Beja, Serpa... novamente Beja e Évora... recordando a personagem dum conto candidato ao Prémio Literário Pedro Ferro…

E nesse dia passamos por lugares marcantes… e levamos o mel que o amigo Alex nos deixara nas bombas de gasolina, junto a sua casa, em terras de Montemaior…


E no final do dia cantaram-nos Elis…