31 de jul. de 2010
plenitude...
plenitude
Serenamente, tão serenamente
como a folha que cai da azinheira
no verão sem brisa, ao fim da tarde
ponho as mãos no teu rosto
chamas-me Plenitude!
não tenho mais que esse momento
Sol
perfume de laranjeira
e a abelha
a sombra do beijo
nas paredes de cal
Mértola, a sul
Amo-te
Amo-te!
leva escrito na janela
o comboio que percorre a campina
nem o Sol é tão poderoso!
insignificante o florir das mimosas
o voo das garças o cio dos alazões…
Paraíso
Na alquimia de cores, negras andorinhas dançavam
músicas do silêncio da terra
estou no Paraíso! Disseste
vestida de Sol na erva
a serpente?!
encantava pássaros nos salgueiros do rio Degebe
Desejo
Escreves amor em papel perfumado
no teclado
poesia de açucenas e vulcânicas lavas!
a terra greta a ânsia
sementes germinam a esperança
o corpo sabe a inutilidade das palavras!
A voz
A sua voz é água da fonte no estio
apetece-me saboreá-la na aurora
esperar o sol dentro dela… é mel!
néctar de flores… vazio a sua falta
escuto-a no melro, voo da gaivota
é brilho, cintila nas estrelas
não são palavras a sua voz
é afago dos olhos, a mão deslizante
a minha boca e a sua, o seu silêncio
Safira perdida
Safira, altares nus em chão de terra
anjos e pássaros partiram…
as abóbadas persistem
do sabugueiro e laranjeira perfumes
meu irmão! do vento da terra do sul
…agora amparam-me os sobreiros
tempo medido nos meus braços
em que tu não estás
e trago-te sempre comigo!
no cemitério só as cruzes de ferro
e montinhos de terra brava sem nome
Maria José Lascas Fernandes, plenitude, 2ª edição, Ed. de autor, Porto, 2006.
(O poema “A voz”, como a Poeta refere, foi também publicado na Antologia
Neruda, Cem Anos Depois…Coord. Cristino Cortes, Universitária Editora, Lx, 2004)
28 de jul. de 2010
do Sul...
Meu Olhar do Sul
Tenho tido vários sítios na vida
mas só no Sul
meu corpo fareja o seu chão
e desabrocha todas as suas folhas
e flores
Meu olhar do Sul rima com água
e com o azul
dos cerros ao longe
mas também com o chão bravio
de estevas em flor
e com a terra de regadio
eternamente noiva
coroada de perfume de flor de laranjeira
Meu olhar do Sul
ama os montes mas também as planícies
mesmo de chão
de mar
Entre água e terra
entre praia e serra
entre barco e raiz
entre casa e asa
meu coração balança
como um papagaio de papel
Teresa Rita Lopes, O Sul dos Meus Sonhos, Gente Singular Editora, Olhão, 2009
23 de jul. de 2010
Saborear a Beleza da Poesia cantada...
Vieste ver-me
ao anoitecer.
Trazias Almutâmide
no olhar.
O menino triste sorriu;
e fez para ti um traço azul…
um traço de silêncio
de Beja
a Agmâte.
Vieste ver-me
ao anoitecer
e partiste comigo no teu olhar…
(in Antologia Os Dias do Amor, 2009)
21 de jul. de 2010
Paraíso...
Bendita sejas tu porque mulher
bendita sejas não porque dás
mas porque o teu prazer é o meu prazer
e só no teu prazer encontro paz.
Correrão muitos rios mas o teu
é o que me leva às águas do baptismo
contigo em cada orgasmo eu subo ao céu
noite a noite contigo eu vejo o abismo.
Corre o Jordão e os Tibre os rios correm
contigo em cada orgasmo eu me baptizo
contigo noite a noite a dor e o riso.
Nas curvas do teu corpo os diabos morrem
bendita sejas tu porque me levas
onde a luz do prazer nasce das trevas.
Eu não sei se me salvo ou se me perco
ou se és tu que te perdes e me salvas
só sei que me redimo quando peco
e corpo a corpo ao céu vão nossas almas.
Manuel Alegre, Sete Sonetos e Um Quarto - Desenhos de João Cutileiro - Lx, Dom Quixote, 2005
12 de jul. de 2010
Plenamente!...
II
Dois hemisférios
os teus dois seios
Dois hemisférios
as tuas pálpebras
Dois hemisférios
os teus joelhos
Dois hemisférios
as tuas nádegas
Dois hemisférios
as tuas faces
uma de espuma
outra de mármore
Dois hemisférios
essas metades
que estão no fundo
da tua alma
uma de tudo
outra de nada
Ah vasto império
ingovernável
por tantos mundos
a desdobrar-se
X
A luz que vibre
sob o teu rosto
O mar que oscile
sob os teus ombros
O que me atinge
vem de mais longe
lá dos confins
em que te sonho
Vll
Horizonte
de zeros
nebulosos
todos os rostos
que não são
o teu
Um dia
sem ouvir
a tua voz
é como descobrir
que o mar
morreu
David Mourão-Ferreira
Os Ramos Os Remos, Areal Editores, Porto, 1985
Dois hemisférios
os teus dois seios
Dois hemisférios
as tuas pálpebras
Dois hemisférios
os teus joelhos
Dois hemisférios
as tuas nádegas
Dois hemisférios
as tuas faces
uma de espuma
outra de mármore
Dois hemisférios
essas metades
que estão no fundo
da tua alma
uma de tudo
outra de nada
Ah vasto império
ingovernável
por tantos mundos
a desdobrar-se
X
A luz que vibre
sob o teu rosto
O mar que oscile
sob os teus ombros
O que me atinge
vem de mais longe
lá dos confins
em que te sonho
Vll
Horizonte
de zeros
nebulosos
todos os rostos
que não são
o teu
Um dia
sem ouvir
a tua voz
é como descobrir
que o mar
morreu
David Mourão-Ferreira
Os Ramos Os Remos, Areal Editores, Porto, 1985
9 de jul. de 2010
António Chainho - a magia da Música ao vento
Começou a tocar guitarra aos 5 ou 6 anos e ao som do vento no moinho do seu avô em São Francisco da Serra:
“Lembro-me de levá-la e às vezes passar noites no moinho. Tinha uma irmã com mais um ano que eu. Ela também tocava guitarra. “
Este homem aparentemente frágil é o génio, o Mestre da Guitarra Portuguesa. A sua modéstia, simplicidade e simpatia estão a par com a sua genialidade.
Chama-se António Chainho e esteve recentemente no Auditório da FNAC de Almada a apresentar o seu mais recente CD LisGoa.
Fruto de um novo reencontro com a música de outras paragens – desde África ou o Brasil com Lisboa-Rio (2000) – nele pressentimos o reencontro com a Sitar, ou com a percussão executadas ou… saboreadas por músicos ocidentais, respectivamente Paulo Sousa e Raimund Engelhardt, um reencontro milenar de Portugal com o extremo oriental indo-europeu; afinal nós, pequeno país ponto de encontro, de chegada e de partida, de seres seduzidos irremediavelmente pelo Mar , miscigenando-nos, amando, inquietos, na busca terrivelmente permanente do infinito, da perfeição – que não existe – e o resultado …. é Almutâmide, é Camões, é Pessoa, é Florbela, é Sofia, é Alegre, é… Zeca Afonso, é Fausto, é Sérgio, é Veloso, é Janita, é Elis, é Caetano, é Chico, é…. esta Música suave e bela e sedutora que nos transporta pelo mar, na crista das ondas, é… o reencontro com a nossa genética ancestral.
E recordo o que Chainho contou sobre o que lhe aconteceu numa digressão recente pela China, quando um miúdo chorou de emoção por Chainho ter aceitado autografar o própia pauta… depois de aquele se ter apropriado dela. António Chainho soube recentemente que provavelmente descende de um viajante cines que se terá instalado na região de Sines há cerca de 500 anos.
fotos de Pedro Roxo
LisGoa um disco luminoso que, para além dos músicos e instrumentos referidos é produzido pelo músico goês Carlos Barreto Xavier, no sintetizador, que também assina os arranjos nalguns temas, outros são de Jonathan Miler – responsável pela mistura e masterização -, na guitarra clássica o excelente músico Tiago Oliveira , as vozes sedutoras, suaves e bem timbradas de Isabel Noronha e da indiana Natasha Lewis e…, claro o Mestre António Chainho, o génio da Guitarra Portuguesa, que nos leva a percorrer o universo, a levitar… ao som do vento, como quando, porventura, em noites de luar ensolarado, passava o tempo tocando, no moinho do seu avô… em São Francisco da Serra, paredes meias com a serra de Grândola, talvez vislumbrando o Mar oceano ali tão perto, na extensa e doce costa Alentejana.
Assinar:
Postagens (Atom)