21 de jul. de 2011

"Eu sou o vento"...


Na 2ªf. vi uma peça de teatro que me fascinou. Foi no último dia do Festival de Teatro de Almada. A peça chamava-se Eu sou o vento.

Eu sei que o espectáculo que encerrou o festival “Retratos da Commedia dell’Arte” foi deslumbrante, uma verdadeira viagem por algumas das mais representativas personagens da Commedia dell’ Arte, Ferrucio Solleri, considerado o melhor Arlequim dos séculos XX e XXI; figurino que iniciou sob a orientação do grande encenador Giorgio Strehler e encarnou ao longo de mais de 50 anos de carreira, aclamado e premiado por todo o mundo. Solleri, com 82 anos, deu-nos conta da sua magistral capacidade interpretativa e agilidade física perante uma imensa massa humana que superlotava o palco grande da Escola D. António da Costa – o palco nobre do festival – em Almada que quiseram assim associar-se à homenagem que o festival e a cidade de Almada prestaram ao mais famoso Arlequim dos últimos 50 anos, como referiu o director do festival e da Companhia de Teatro de Almada, Joaquim Benite e a edil Maria Emília Sousa. Na cerimónia que antecedeu usaram da palavra o próprio Ferrucio Solleri, Eunice Munoz – homenageada na 1ª edição do festival – Yo Apoloni, que apresentou o espectáculo e Rodrigo Francisco director-adjunto.

Eu estava na primeira fila a escassos metros dos intervenientes e do que se passava em palco - na primeira das duas filas improvisadas no momento para ninguém ficar de pé - deu para saborear cada gesto e respiração do grande Arlequim.

Eu sei que nesta 29º edição do Festival de Almada, que contou com a apresentação de 30 trabalhos cénicos, com diversas espectáculos oriundos de Itália, Holanda, Roménia, Alemanha, Espanha, França, Chile, Tunísia, Estados Unidos e Reino Unido e se estendeu-se por 14 salas e espaços cénicos de Almada, Lisboa e Porto, onde foi possível assistir a uma diversidade da propostas cénicas, desde estreias como “A Rainha louca” (Ópera, libreto e direcção musical de Alexandre Delgado, a partir de o tempo feminino de Miguel Rovisco, com encenação de Joaquim Benite), O Avarento de Moliére, encenação de Rogério de Carvalho pelo Ensemble – Sociedade de Actores, votado em 2010 como Espectáculo de Honra pelo público ou Ela, de Jean Genet, uma encenação de Luís Miguel Cintra – uma interpretação soberba, humanizando e desconstruindo a figura do Sumo Pontifice.

Eu sei que ouve outros excelentes espectáculos, como, logo na abertura a “Fabula Bufa” (a partir de Dario Fo), pelo Teatro Picaro, “Um certo sonho, uma noite de Verão (a partir Shakespeare), texto e encenação de Richard Demarcy, pelo Naíf Théatre, pelo Viaje Inmóvil “Chef” (a partir de Uma modesta proposta, de Jonathan Swift), colaboração de Guillermo Calderón e encenação de Jaime Lorca. Ou “Ammnesia”, de Jalila Baccar e Fadhel Jaibi – que encenou, pela Família Productions, de Tunis, ou a Compagnie Louis Brouillard com “Cercles/Fictions”, exto e encenação de Joel Pommerat, ou “Les Corbeaux”, pelo Centre Chorégraphique National d’Orléans, que não tive oportunidade de ver mas de que me guegaram ecos de excelência… ou o que foi votado pelo público como Espectáculo de Honra”Que faire? (Le retour), pelo Théatre Dijon Bourgogne – CDN, encenado por Benoît Lambert e com interpretação dos excelentes Martime Schambader e François Chattot – que tínhamos adorado o ano passado no papel de Hamlet em “Cabaret Hamlet”e intimamente escolhi como o melhor espectáculo dessa edição do festival.

Excelentes espectáculos com encenações, propostas cénicas e cenográficas, sonoplastias excelentes, inovadoras nalguns casos, mas … fiquei deslumbrado com...
o espectáculo da companhia Young Vic / Théatre de la Ville, uma encenação excelente – do prestigiado Patrice Chéreau, um dos mais reputados encenadores de teatro e ópera e cineasta, de França que aqui dirige a sua primeira produção para o palco em língua inglesa, uma interpretação arrasadora, de Tom Brooke e Jack Laskey, num cenário dantesco, assinado por Richard Peduzzi, onde uma jangada que submerge e um manto de água nos dão a imensidão dum belo texto, poético “I Am the Wind”, de Jon Fosse – dramaturgo galardoado com o Prémio Ibsen, com uma nova adaptação em versão inglesa de Simon Stephens – vencedor do Prémio Lawrence Olivier.
 uma tocante fábula contemporânea, Eu sou o vento é para o crítico Paul Taylor do The Independent: “do melhor teatro que alguma vez vi. O espectáculo é lindo, de cortar a respiração.”
Este espectáculo estreado em Londres, iniciou uma digressão que passou por Paris, Viena, Lyon, Barcelona, Avignon e terminou em Almada foi seguramente um dos momentos altos da edição deste ano do Festival de Almada.




Se o mar fosse azul, mais azul e menos cinzento, se fosse até de um azul quase turquesa, o nosso mar do Sul Azul, mediterrânico, Atlântico a caminho do Sul, eu diria quanto me senti identificado
naquele belo texto... e até naquela deslumbrante cenografia e interpretação...


Porque,

parafraseando Sophia:

Quando eu morrer voltarei para buscar
Os instantes que não vivi junto do mar
Ou melhor, diria “entrando” na voz de Sophia:

Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós
É tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho
Que momentos há em que eu suponho
Seres um milagre criado só para mim.
pois, como também diz Sophia
é o Atlântico

Mar
metade da minha alma é feita
de maresia
Ou como est’outro Poema Azul de Sérgio Ricardo, cantado por Maria Bethânia em Mar de Sophia

O mar beijando a areia
O céu e a lua cheia
Que cai no mar
Que abraça a areia
Que mostra o céu
E a lua cheia
Que prateia os cabelos do meu bem
Que olha o mar beijando a areia
E uma estrelinha solta no céu
Que cai no mar
Que abraça a areia
Que mostra o céu e a lua cheia
Um beijo meu.