Esta é a história de um menino e de uma menina que poderiam ter-se conhecido no mar, tal a importância do mar para eles o que de comum lhes aconteceu. E se a história de uma vida é tão complexa ainda mais o é quando de dois seres se trata, um mundo vasto feito de encontros e desencontros que se pode resumir a efémeros dias, mas que se pode estender a anos, décadas ou até séculos ou milénios.
A menina vivia num castelo, um lindo castelo alvo como a espuma das ondas. Vivia embasbacada de tédio debaixo da grande asa protectora de um pai omnipresente e poderoso, mas triste porque no mais profundo do seu íntimo sabia que não lhe podia dar a felicidade por que ela tanto ansiava. Viviam os dois infelizes , mas ricos e faustosos e anafados de mordomias, pois afinal ele era um dos representantes mais poderosos do rei na região e a população do povoado junto ao castelo rendia-lhes homenagem, fossem os camponeses, os artesãos ou os demais habitantes.
A menina, que gostava de flores amarelas, era muito bonita e endiabrada mas quando o pai lhe levantava a voz caía em si na tristeza da sua vida de honrarias e fausto.
Um dia em que foram viajar ela conheceu um menino. Aconteceu num palácio onde havia uma fonte com água cristalina, papoilas, jasmim e pétalas de rosa. O menino deu-lhe água daquela fonte que ela achou a mais refrescante. Ele era de um país onde os pássaros eram de cristal e o mar era sulcado por sereias que entoavam cânticos a Iemanjá, cânticos nascidos da boca de velhos marinheiros seduzidos irremediavelmente pela doçura da sua voz. O menino era de um país azul, mas esse era o seu país adoptivo pois ele antes já havia sido pássaro e demandara todos os mares do Sul em busca da beleza. A primeira vez que desembarcará naquela cidade, pássaro do Sul, vindo na gávea dum barco sentiu sinais da menina nas montanhas azuis que recortavam o horizonte. Então tomou a forma humana e esperou serenamente a sua chegada. Naquele tempo de espera aprendeu com os velhos feiticeiros e encantadores de serpentes a construir caixinhas de música com lindas bailarinas que dançavam sempre e lhe lembravam a voz inigualável da menina por quem esperava. Usava-as para lembrar aos pardais seus irmãos a chegada dos caçadores e na Primavera fazia dos campos de papoilas imensos bailados e belas coreografias.
As saudades da menina deram-lhe uma ideia: e como “não há nada mais poderoso do que uma ideia cujo momento chegou” como diria Víctor Hugo, trabalhou de dia e de noite para lhe fazer uma surpresa. Construiu a mais bela caixinha de música de que havia memória, incrustada de safiras e de rosas do deserto com uma bailarina coberta das mais lindas flores amarelas que dançava, dançava com doçura e volúpia. E partiu do seu país azul e distante. Percorreu esse país com casas de barras ocre de campos imensos e trigais a perder de vista com flores de esteva nas encostas, atravessou um deserto onde quase sucumbiu e uma montanha com neves eternas e frondosos cedros. Poucos dias antes de chegar ao país da menina enviou uma irmã pomba branca, que teve a triste sorte de chegar num dia em que os caçadores percorriam os campos em redor do castelo. Morreu com um tiro certeiro de um deles, o pai da menina, mas não sem antes de cair moribunda aos pés desta e lhe entregar a boa nova da vinda do menino do país azul. A tristeza pela morte da pomba não retirou a ambos completamente o sorriso pelo encontro eminente, pois sabiam que a vida também era feita de sofrimento.
O pai todavia ficou desconfiado ao ver a pomba morta à entrada do castelo e interrogou a menina ameaçando-a com um terrível castigo: expulsá-la do belo castelo que ela tanto amava, caso não cumprisse as suas ordens. A menina ficou muito assustada e quando nessa noite se esgueirou por entre as ameias do castelo e encontrou o menino numa praia banhada pelo luar estava muito nervosa: estava quase hirta em vez do seu andar sensual e do brilho fulminante do seu olhar apenas uma réstea envergonhada se via. Quando falou a sua voz perdera a doçura, era falsamente dura de assustada e tristeza escondida. O menino que já tinha pressentido, com a morte da pomba que algo de estranho e mau se passava, mesmo assim estava embevecido pela sua beleza, quase a chorar de emoção, ficou estupefacto pelo medo que saia do seu olhar. A sua voz de medo era tão dura e as palavras tão terríveis que as ondas ficaram suspensas nas suas cristas os peixes ficaram parados e a lua escondeu a face. E a menina a tremer de cólera com o medo no olhar espalhava a dor e a mágoa na alma do menino. Este contemplou-a longamente tocou-lhe ao de leve no rosto e partiu para o seu país azul não sem antes deitar ao mar a mais bela caixinha de música que tinha existido. Caiu-lhe de rosto uma lágrima de cristal como o palácio onde se conheceram, enquanto a bailarina com o som da voz doce da menina rodopiava pela última vez.
Percorreu o caminho de regresso cada vez mais triste e indiferente a tudo e quando chegou ao país azul o mar que antes era turquesa estava escuro e cinzento. Entrou no mar dentro deitou-se nas ondas e no meio de uma imensa tristeza foi escoltado pelas sereias que choravam a sua perca e o seu regresso ao início dos tempos. O Sol deitou uma lágrima de fogo e de cristal e as pessoas assustaram-se pensando que o mundo ia acabar. Uma gaivota levou então a notícia e a menina chorou muito e ficou muito triste. Era tarde de mais. A tristeza fê-la perder a vontade de contemplar o mar, o Sol e as estrelas, o luar, as papoilas, a beleza e a poesia da vida. A menina envelheceu rapidamente tomando conta do seu pai, também ele cada vez mais triste por saber que a tristeza nunca mais os abandonaria pois a menina tinha desperdiçado a sua única possibilidade de poder ser feliz, coisa que ele não lhe podia dar.
A menina e o seu pai omnipresente morreram de tédio e de tristeza.
O medo pode tanto, pode até levar à insensibilidade e à tristeza infinita.
A menina vivia num castelo, um lindo castelo alvo como a espuma das ondas. Vivia embasbacada de tédio debaixo da grande asa protectora de um pai omnipresente e poderoso, mas triste porque no mais profundo do seu íntimo sabia que não lhe podia dar a felicidade por que ela tanto ansiava. Viviam os dois infelizes , mas ricos e faustosos e anafados de mordomias, pois afinal ele era um dos representantes mais poderosos do rei na região e a população do povoado junto ao castelo rendia-lhes homenagem, fossem os camponeses, os artesãos ou os demais habitantes.
A menina, que gostava de flores amarelas, era muito bonita e endiabrada mas quando o pai lhe levantava a voz caía em si na tristeza da sua vida de honrarias e fausto.
Um dia em que foram viajar ela conheceu um menino. Aconteceu num palácio onde havia uma fonte com água cristalina, papoilas, jasmim e pétalas de rosa. O menino deu-lhe água daquela fonte que ela achou a mais refrescante. Ele era de um país onde os pássaros eram de cristal e o mar era sulcado por sereias que entoavam cânticos a Iemanjá, cânticos nascidos da boca de velhos marinheiros seduzidos irremediavelmente pela doçura da sua voz. O menino era de um país azul, mas esse era o seu país adoptivo pois ele antes já havia sido pássaro e demandara todos os mares do Sul em busca da beleza. A primeira vez que desembarcará naquela cidade, pássaro do Sul, vindo na gávea dum barco sentiu sinais da menina nas montanhas azuis que recortavam o horizonte. Então tomou a forma humana e esperou serenamente a sua chegada. Naquele tempo de espera aprendeu com os velhos feiticeiros e encantadores de serpentes a construir caixinhas de música com lindas bailarinas que dançavam sempre e lhe lembravam a voz inigualável da menina por quem esperava. Usava-as para lembrar aos pardais seus irmãos a chegada dos caçadores e na Primavera fazia dos campos de papoilas imensos bailados e belas coreografias.
As saudades da menina deram-lhe uma ideia: e como “não há nada mais poderoso do que uma ideia cujo momento chegou” como diria Víctor Hugo, trabalhou de dia e de noite para lhe fazer uma surpresa. Construiu a mais bela caixinha de música de que havia memória, incrustada de safiras e de rosas do deserto com uma bailarina coberta das mais lindas flores amarelas que dançava, dançava com doçura e volúpia. E partiu do seu país azul e distante. Percorreu esse país com casas de barras ocre de campos imensos e trigais a perder de vista com flores de esteva nas encostas, atravessou um deserto onde quase sucumbiu e uma montanha com neves eternas e frondosos cedros. Poucos dias antes de chegar ao país da menina enviou uma irmã pomba branca, que teve a triste sorte de chegar num dia em que os caçadores percorriam os campos em redor do castelo. Morreu com um tiro certeiro de um deles, o pai da menina, mas não sem antes de cair moribunda aos pés desta e lhe entregar a boa nova da vinda do menino do país azul. A tristeza pela morte da pomba não retirou a ambos completamente o sorriso pelo encontro eminente, pois sabiam que a vida também era feita de sofrimento.
O pai todavia ficou desconfiado ao ver a pomba morta à entrada do castelo e interrogou a menina ameaçando-a com um terrível castigo: expulsá-la do belo castelo que ela tanto amava, caso não cumprisse as suas ordens. A menina ficou muito assustada e quando nessa noite se esgueirou por entre as ameias do castelo e encontrou o menino numa praia banhada pelo luar estava muito nervosa: estava quase hirta em vez do seu andar sensual e do brilho fulminante do seu olhar apenas uma réstea envergonhada se via. Quando falou a sua voz perdera a doçura, era falsamente dura de assustada e tristeza escondida. O menino que já tinha pressentido, com a morte da pomba que algo de estranho e mau se passava, mesmo assim estava embevecido pela sua beleza, quase a chorar de emoção, ficou estupefacto pelo medo que saia do seu olhar. A sua voz de medo era tão dura e as palavras tão terríveis que as ondas ficaram suspensas nas suas cristas os peixes ficaram parados e a lua escondeu a face. E a menina a tremer de cólera com o medo no olhar espalhava a dor e a mágoa na alma do menino. Este contemplou-a longamente tocou-lhe ao de leve no rosto e partiu para o seu país azul não sem antes deitar ao mar a mais bela caixinha de música que tinha existido. Caiu-lhe de rosto uma lágrima de cristal como o palácio onde se conheceram, enquanto a bailarina com o som da voz doce da menina rodopiava pela última vez.
Percorreu o caminho de regresso cada vez mais triste e indiferente a tudo e quando chegou ao país azul o mar que antes era turquesa estava escuro e cinzento. Entrou no mar dentro deitou-se nas ondas e no meio de uma imensa tristeza foi escoltado pelas sereias que choravam a sua perca e o seu regresso ao início dos tempos. O Sol deitou uma lágrima de fogo e de cristal e as pessoas assustaram-se pensando que o mundo ia acabar. Uma gaivota levou então a notícia e a menina chorou muito e ficou muito triste. Era tarde de mais. A tristeza fê-la perder a vontade de contemplar o mar, o Sol e as estrelas, o luar, as papoilas, a beleza e a poesia da vida. A menina envelheceu rapidamente tomando conta do seu pai, também ele cada vez mais triste por saber que a tristeza nunca mais os abandonaria pois a menina tinha desperdiçado a sua única possibilidade de poder ser feliz, coisa que ele não lhe podia dar.
A menina e o seu pai omnipresente morreram de tédio e de tristeza.
O medo pode tanto, pode até levar à insensibilidade e à tristeza infinita.
Um comentário:
Da Professora Doutora Maria José Palla - minha professora da cadeira de História do Teatro no início de 90 na FCSH -transcrevo e registo, com a devida vénia, as palavras amigas e sentidas que enviou para o meu endereço:
"meu querido
a história tem um final triste... p perfume de laranjeira é maravilhoso... e a tua tese também... "
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