2 de jul. de 2020

O Trabalho, o Capital… e o Futuro?

Em tempos de pandemia
O Trabalho, o Capital… e o Futuro?
Antes de mais importa contextualizar, neste planeta a sofrer agora e de forma mais acentuada do que há um mês, os efeitos trágicos da pandemia.
Um pouco pela Europa, mas também pelo mundo – salvo variações com laivos autoritários como na própria Europa, dos regimes autoritários da Polónia e na Hungria – vemos os governantes a cerrar fileiras, assumindo o Estado a coordenação e a “defesa” dos cidadãos, através dos serviços públicos de saúde, num combate por vezes terrível – como aconteceu em Itália e posteriormente em Espanha, revelando-se lideranças à altura das circunstâncias: a resposta do Estado Social.
Por outro lado, no campo oposto surgem os líderes de dois importantes países: os EUA e o Brasil. Do país “mais poderoso” do mundo, um indivíduo caricato, gabarolas, com total incoerência, qual boneco animado, em permanente show televisivo, enquanto a epidemia já ultrapassou os 58 mil mortos registados com a traumática guerra do Vietnam - e seria bem pior não fosse os governadores dos Estados face à inoperância do governo federal. Extremamente arrogante com os jornalistas, com as sugestões perigosamente imbecis como a de matar o vírus ingerindo lixivia e com um ego tal que chegou a acusar a China de ter inventado o COVIT-19 para ele não ser reeleito presidente.
No meio da crise deixo um abraço à comunidade lusodescendente, nomeadamente de Fall River e aos Portuguese Kids, que diariamente divulgam a identidade cultural portuguesa.
Outra figura sinistra também do continente americano, personifica um tempo que se julgava definitivamente ultrapassado, mas segundo a antropóloga e historiadora brasileira Lilia Schwarcz – autora de “Sobre o Autoritarismo Brasileiro” – “Jair Bolsonaro não é um fenómeno estranho na evolução do país, mas um representante de uma certa forma de pensar, sobretudo, de mandar que se pensou estar a perder força desde o fim da ditadura nos anos 1980, mas que estava apenas à espera do momento certo para regressar em força”. Um poder das famílias tradicionais que remontará ao modelo das capitanias donatárias hereditárias da colonização portuguesa, “um mandonismo” – que “acumulavam numa família os poderes político, económico, religioso e cultural”, expressivo com os “coronéis” no século XIX e que em pleno século XXI regressa em força. E o racismo que a escravatura – só abolida em 1888 – deixou marcas e profundas desigualdades, que a pandemia veio dar mais expressividade, como o gravíssimo ataque às populações indígenas.
Abandonado por políticos que o apoiaram e o seguiram e hoje são seus grandes opositores, de sectores da direita moderada, Bolsonaro hoje tem o apoio limitado à extrema-direita e não se cansa de invocar a possibilidade de uma intervenção militar.
São estes dois presidentes de dois maiores países do continente americano, exemplos da expressão populista e se o “Governo Bolsonaro é um governo de raiz autoritária, retrógada”, Trump não lhe fica atrás na sua postura egocêntrica de estar acima de lei. Temos assim o “cowboy-pistoleiro, do velho Oeste”, que faz a sua própria lei e que quem hoje lhe rende inteira obediência pode amanhã cair em desgraça, enquanto para o amigo do Sul a lei só existe para proteger o clã familiar… da própria lei.
No nosso país, paralelamente a um esforço coordenado pelo Estado, eficaz e com frutos contra a pandemia, vivemos entre a hipocrisia da promiscuidade entre deputados e futebol e o “deputado-comentador-consultor fiscal”, com a sede do poder e com tal necessidade de dar nas vistas que propõe um “plano de confinamento específico” para a comunidade cigana. Os ciganos não devem ser discriminados: têm direitos e deveres como todos. Como tal as forças de segurança têm de fazer cumprir a lei em “Estado de Excepção” como recentemente vivemos e quem transgride não pode ficar incólume, seja quem for. Num Estado de Direito não se pode permitir o racismo, mas a lei tem que ser cumprida por todos.
Face aos 113 milhões de europeus em risco de pobreza e exclusão social e 25 milhões que vivem abaixo do limiar da pobreza, só na Europa, a aplicação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, com a implementação de um rendimento mínimo europeu, defendido pelos ministros do Trabalho, Solidariedade e Políticas Sociais de Portugal, Espanha e Itália, respectivamente Ana Mendes Godinho, Pablo Iglesias e Nunzia Catalfo, será um passo importante.
As comemorações do 25 de Abril em casa e circunscritas ao mínimo no Parlamento pelos representantes do povo e as do 1ª de Maio na Alameda foram em países diferentes? Se o cidadão normal, que trabalha, paga impostos – e até paga a quota do sindicato – ficou confinado ao seu concelho, como foi possível sindicalistas viajarem para Lisboa? A democracia, a liberdade tão duramente conquistada, que custou tanto sofrimento, vidas desfeitas, mortes, antes de 1974, não pode pactuar com os novos privilégios, com novas corporações, que estão acima da lei, seja a comemorar o 1º de Maio com mil pessoas ou em casamentos ciganos com 300 pessoas.
E se há sindicatos que nos merecem o respeito dos portugueses – casos da FENPROF, SPGL, só para dar dois exemplos – outros infelizmente servem interesses e agendas estranhos aos trabalhadores que deveriam dignamente representar. Tal só conduz ao descrédito do sindicalismo e da democracia; esta realidade adicionada ao “fechar os olhos” ao não cumprimento da lei por muita da comunidade cigana só abre espaço às propostas neofascistas do populismo de extrema-direita, que espreita, pronta a atacar, em Portugal e no mundo.
25 de abril, sempre!
Viva o 1º de Maio!
(Artigo publicado na "Folha de Montemor", edição de 15 de Maio)
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