12 de mar. de 2007

com Cláudio Torres em Mértola...


Foi um dia maior... chegamos ao fim da manhã, visitamos as magníficas instalações do futuro Centro de Estudos Islâmicos e Mediterânicos, frente ao grande rio do Sul, que entre pelas janelas ensolaradas com uma força... avassaladora.. no centro do casco histórico, muito perto da Torre do Relógio, aqui na imagem... e ficamos a conversar, ou melhor, a ouvir o Mestre... falar do importante papel desempenhado pelos muladis no Gharb, dos reinos Taifas, das suas cortes onde havia tertúlias literárias e báquicas e musicais, e das escravas-cantoras-mulheres livres e cultas, muito cultas, do prazer sensorial e intelectual de que Al Mouhatamid nos fala neste poema que é quase um premonição da guerra que se avizinhava.. e que o havia de levar ao desterro em Âgmat


Noite de Festa

Bebi vinho que derramava luz enquanto a noite estendia
o seu manto de trevas

até que a lua cheia se mostrou na constelação de Geminis
como uma rainha no apogeu da sua pompa e do seu fausto.

Estrelas brilhantes surgiram à porfia para a rodear
com o seu fulgor e contemplar o dela.

Depois quando a lua quis caminhar até ao Ocidente
levantou Orion por cima de si como um dossel
e as estrelas avançaram de ambos os lados como batalhões
que erguiam as Plêiades por bandeira.

Assim sou eu na terra entre esquadrões e mulheres formosas
que aliam o seu esplendor com o alto grau.
Se as lorigas dos guerreiros esparzem trevas,
os vasos de vinho das donzelas enchem-nos de claridade.

E se as escravas cantam acompanhado-se com a cítara,
as espadas dos meus donzéis não deixam por isso de cantar
nos crânios dos inimigos.





e falamos de ulemas e dos fundamentalistas do Norte face aos do Sul Almorávidas e Almôadas, pondo fim ao longo período de tolerância e de coexistência quase sempre pacífica, e de como o Islão fez, na Península Ibérica, a síntese da civilização mediterrânica, mercantil e tributária e urbana e de como depois isso depois inflenciou decisivamente as cidades meridionais de Portugal e Castela na realização da Expansão Marítima, com os seus sábios, os seus mestres.. e desses últimos sábios desta civilização, como Avicena, Averróis... e dei comigo a pensar que estava a falar com um sábio, um sábio não só pelos seus conhecimentos invulgares mas também pela forma cativante e humana como os expõe... e depois do almoço, onde encontramos outro amigo, o arqueólogo Jorge Feio, continuamos a falar naquele salinha simpática da sede do Campo Arquelógico de Mértola, falamos... do cante... e dos nossos poetas populares repentistas, do século XX... e do século XI...

...e visitamos a oficina da Nádia e as belas peças de joalharia que ela produz...

...despedimo-nos já a lua se anunciava... naquele dia 8 de Março, dia ensolarado, bonito para oferecer um poema...oferecer flores, dia comemorado por toda a parte, também em Moreanes onde passamos na abalada...
...despedimo-nos daquela vila especial e única onde sentimos em cada casa, em cada pedra um tempo passado que nos corre no sangue, que nasceu aqui, que não nos foi imposto ou é estrangeiro, que significa o encontro com o NOSSO passado, não o encontro com o outro, sim o Encontro com os nossos próprios, a Nossa memória intacta, subtilmente preservada porque Património intangível... feito de tanta coisa, feito da palavra...

...despedimo-nos de Cláudio Torres, o Mestre, com um abraço emocionado...

foi um dia Maior...














....dois dias depois estavamos mais a Norte...
...novamente nas margens deste grande rio, em Badajoz - onde estivemos numa reunião preparatório do II Encuentro Transfronteiriço de Revistas de Cultura -, e contemplavamos, entre pontes...
...do passado e do presente...
...os campos verdejantes que certamente no passado foram hortas que abasteciam os mercados destas cidades harmoniosas e autosuficientes, pequenas, médias cidades....como Beja e os seus pomares circundantes, terras ricas de barros, bem no centro da planície...

Um comentário:

marialascas disse...

Já o disse muitas vezes, sendo natural do concelho de Montemor-o-Novo, e apesar da beleza de Monsaraz, o meu concelho do coração é Mértola. Gostava que um dia este concelho me adoptasse. Não há lugar em que melhor me sinta. Não há lugar em Potugal em que eu sinta com maior intensidade a presença do meu passado árabe e do meu amor árabe... Não há lugar com pessoas tão simpáticas acolhedoras e devotas à comunidade como Zé Rodrigues e a Dina. Não há nenhum lugar tão mágico. Ficaria à luz da Lua a ouvir infinitamente o Cláudio Torres, de preferência a despite com Santiago Macias... Eduardo, um homem com Cláudio Torres é de certeza um dos meus "cavaleiros vermelhos" do Segrdo do Sahara. Invejo o teu dia e fico feliz por ti.