Aconteceu em Montemor-o-Novo nos dias 27 e 28 de Maio de 2011. Foram as 1ªs Jornadas Literárias de Montemor-o-Novo e tiveram lugar na Biblioteca Municipal Almeida Faria. Foram as 1ºs Jornadas Literárias que aconteceram no Alentejo desde que há memória, pelo menos nas últimas décadas. Este acontecimento, não só por ser inovador foi um êxito a todos os níveis.
Por Montemor passaram um conjunto de escritores, poetas, diseurs, investigadores, músicos, bailarinos, editores e moderadores que ultrapassaram uma vintena.
Na sessão de abertura Carlos Pinto de Sá, Presidente do Município - entidade organizadora, destacou a importância da realização destas Jornadas, pois “apesar da grave crise económica, o Município continua a apostar fortemente na Cultura” e nós, enquanto co-responsáveis pela realização do evento, realçamos a presença de autores representativos de todo o Alentejo “com posturas estéticas, percursos e vivências geracionais diversas” e lemos uma mensagem de José Luís Peixoto, que lamentado estar ausente, terminava: “O Alentejo precisa disto!”
No primeiro dia iniciou com o painel intitulado:
O Alentejo na criação literária, que abriu com uma intervenção de fundo de João Mário Caldeira, autor de diversas obras de ficção mas também um conhecedor profundas das terras, das gentes e dos costumes do Alentejo, mais especificamente da Margem Esquerda do Guadiana, onde foi director da antiga Escola de Artes e Ofícios Tradicionais de Serpa e que publicou em 2000 um trabalho decisivo para a compreensão da identidade alentejana: Margem Esquerda do Guadiana. As gentes, a terra, os bichos. João Mário lançou algumas questões para o debate de onde se destaca:
1 – Se o Alentejo estimula a criação literária
2 - Se essa realidade favorece a qualidade literária
3 – Até que ponto é determinante a origem alentejana para estes escritores.
Estava dado o mote, para este painel, mas que transpareceu ao longo das jornadas. Depois seguiram-se intervenções de Joseia Matos-Mira, Henrique Matos e João Luís Nabo, tendo este último feito uma intervenção bem fundamentada sobre o tema em dabate, que foi moderado pelo amigo e editor Fernando Mão de Ferro.Após o recital, de Jorge Lino seguramente um dos melhores diseurs portugueses que nos trouxe poemas de Hugo Santos e Evocação aos peixes de Padre António Vieira, seguiu-se uma evocação a José Saramago, tendo como ponto de reflexão Levantado do Chão. Aqui tivemos excelentes intervenções como a de João Céu e Silva, que biografou José Saramago e nos trouxe a poética do jornalista que persegue a “história”, neste caso, por terras de Monte Maior. Ainda neste painel, moderado por Filipe Chinita, Jorge Vaz de Carvalho, Coordenador Científico de Estudos Artísticos da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica fez uma intervenção que primou pela excelência, terminando os trabalhos do primeiro dia, que findou com a passagem do filme José Pilar no Teatro Curvo Semedo.A Mulher na Poética Mediterrânica, abriu com Vítor Encarnação, de Ourique, um nome a ter um conta para o futuro das letras portuguesas, que nos trouxe a “encontro” da poética do escritor no universo feminino. Elisa Valério, que se lhe seguiu, poeta e investigadora, deu o contraponto da incursão da mulher no universo masculino: o côncavo e o convexo. António Murteira e Francisco do Ó Pacheco, antigo edil de Sines e antigo director do Diário do Alentejo, trouxeram experiências estéticas e de latitudes diversas, de Abril à experiência africana. Terminou o painel com Elisa Valério sugerindo a realização das segundas jornadas, tal o nível de envolvimento e qualidade atingido.
Jorge Lino
Jorge Vaz de Carvalho, Filipe Chinita e João Céu e Silva
Vitor Guita introduz a leitura de textos na Evocação de João Alface
Ao final da manhã Vitor Guita evocou o escritor montemorense João Alface, numa sala apinhada onde se ouviram textos do homenageado por vozes femininas.
Margarida Morgado, André Gago, Eduardo M. Raposo, Manuel Parreira da Silva e Teresa Cuco
O painel da tarde abriu com uma intervenção de actor e escritor André Gago, que partindo do seu romance Rio Homem, falou-nos d ' O Amor, como elemento catalisador da Poesia Lírica desde Camões até à actualidade. A sua intervenção, neste painel que moderamos teve ainda intervenções entusiastas, emotivas de Margarida Morgado, Teresa Cuco e o olhar académico da professora e investigadora Manuela Parreira da Silva.
Manuel Neto dos Santos, Adel Sidarus e José OrtaO derradeiro painel , sobre A poética do Vinho e a sensualidade no Mundo Mediterrânico contou Adel Sidarus, egipcío copta e académico jubilado da Univeridade de Évora, que nos falou do vinho no mundo mediterrânico e Manuel Neto dos Santos, poeta e investigador autodidacta de Alcantarilha (Silves) que se tem vindo a especializar na obra dos poetas luso-árabes como Almutâmide e Ibne Amar. Foi moderador José Orta, docente do Instituto Politécnico de Beja.
Paulo Ribeiro e E. Pablo durante o recital "O Amor e o Vinho"
As 1ªs Jornadas Literárias de Montemor-o-Novo terminaram com um emotivo recital de Música, Poesia e Dança, sobre O Amor e o Vinho, por Paulo Ribeiro, E. Pablo e Elsa Shams, ontem estiveram em destaque Manuel da Fonseca – que foi simbolicamente evocado, Martinho Marques, Paulo Ribeiro, Maria Lascas, Almutâmide, Manuel Alegre, Natália Correia, Florbela Espanca, José Luís Peixoto e Pablo Neruda.
Elsa Shams e E. Pablo ao som de Almutâmide
Quando o Sol se preparava para encontrar a Lua nos campos de Monte Maior, participantes, oradores e organizadores confraternizavam no pátio da Biblioteca, saboreando petiscos mediterrânicos com vinho tinto.
José Orta no convívio
Estas Jornadas, organizadas pelo Município de Montemor-o-Novo e que tiveram uma muito entusiástica adesão do público – de referir também a excelência dos debates – constituiram um marco e provavelmente um inicio para a divulgação e valorização das Letras Portuguesas feitas por Alentejanos e não só, a tal ponto que houve quem comparasse a importância inovadora deste evento com a instalação em Montemor do “Espaço do Tempo”, que nesse dia comemorava o seu 10º aniversário.
A Poesia da Terra em Monte Maior contou ainda com mostras de livros dos autores presentes e sessões de autógrafos de André Gago, Vítor Encarnação e Manuel Neto dos Santos.
(O texto transcrito corresponde, no essencial, à crónica mensal "À soleira da porta", publicada na edição de Junho do Jornal Folha de Montemor).
e o poema com que terminamos o recital
Credo
creio nos anjos que andam pelo mundo
creio na deusa com olhos de diamante
creio em amores lunares com piano ao fundo
creio nas lendas nas fadas nos atlantes
creio num engenho que falta mais fecundo
de harmonizar as partes mais dissonantes
creio que tudo é eterno num segundo
creio num céu futuro que houve dantes
creio nos deuses de um astral mais puro
na flor humilde que se encosta ao muro
creio na carne que enfeitiça o além
creio no incrível nas coisas assombrosas
na ocupação do mundo pelas rosas
creio que o amor tem asas de oiro amén
Natália Correia
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