21 de mar. de 2010

A Poesia está na rua!


Com a chegada da Primavera, a Poesia está na rua! Tomou os espaços e os momentos, inebriou o chilreio dos pássaros, irmãos do vento suave e o pólen das flores paira nos odores dos afectos, o Sol voltou ao Alentejo e o seu brilho ao olhar das gentes regressou. Depois da tempestade que alquebrou a alma dos Poetas eles despertam de novo, exuberantes de Vida e de projectos na construção dos sonhos que iluminam o passar dos dias.


Cantemos pois a consumação dos sonhos. Façamos da beleza dos gestos e dos silêncios dos lábios que se procuram, dos corpos que, plenos e totais, se desejam o roteiro das flores que amainaram o desespero dos seres antes famintos de luz e de ternura. Façamos do cântico dos Poetas, artífices do sonho (que nunca é impossível) e arquitectos da beleza a força da Vida… possível, realizável, pungente, urgente como o sereno ritmo latejante dos homens e mulheres construtores da eternidade dos momentos a realização do Amor.


O PREC e a Poesia

 



Havia palavras e afectos. Havia vozes e imagens da meninice de um tempo anterior - quando na Casa da Malta o Amor era proibido e o desejo ostracizado - pela voz serena, humanista e bem timbrada de Custódio Gingão. Havia o discurso mais politizado de Murteira e a afirmação clara, objectiva do Carlos (Pinto de Sá) que, como disse, não se limita a gerir a Autarquia, mas antes realiza um projecto político caracterizado pela fraternidade, pelo humanismo, pela dignidade na valorização da auto-estima, da Memória. Havia o discurso inflamado, subtil e bem humorado de Andrade e Silva e havia o riso e o choro do Chico Ceia, recordando a "deixa" do som da voz de Gingão, quando nos anos 70 percorriam de motorizada e guitarra a tiracolo as cooperativas, levando palavras com sabor a futuro...
Depois, de pé - como o Homem Alentejano Vive; a prumo para o Sol e para a Terra - fazendo da voz a guitarra, 31 anos depois, partilhando o poema/canção que dedicou a Caravela e a Casquinha irrompeu no silêncio imenso de uma sala toda ocupada de afectos.










E depois a "Grândola" cantada em uníssono, consumação do futuro, hino de propostas da (re) construção da dignidade no Alentejo, deixadas pelo Custódio e pelo Murteira e concretizadas pela acção do Carlos e dos companheiros na Autarquia, pela disponibilidade do Andrade e... pela Poesia serena e bela na voz do Ceia.


E os amigos presentes, de Beja, do Algarve, de Lisboa, de Almada, do Seixal e... de Montemor: o Zé Orta, o Dinis, a Inês, o Constantino,  o Domingos, o Naia, a Céu, o Ramos, o Chico Braga, o Alex, a Manela, a Vina, os amigos autarcas, tantos... muitas, muitos amigos... de Montemor.


Foi a mesa-redonda: "O PREC no Alentejo: Poder Popular ou imposição revolucionária?"


No fim gritei a plenos pulmões, um sentir vindo do fundo da alma: "Foi bonita a festa, pá/cá estou carente/e ainda guardo apaixonadamente/ uma rosa vermelha para ti."

A Exposição "PREC  Cantar a Revolução no Alentejo" continua até 30 de Abril. Com imagens, breves biografias e textos/depoimentos do Zeca, do Adriano, do Cília, do Sérgio, do Manel Freire, do Fanhais, do Naia, do Ceia, do Fausto, do José Jorge, do Samuel, da Luísa Basto, da Maria do Amparo, do José Mário, do Janita, do Vitorino.
Uma palavra fraterna à Inês Ramos, que num exíguo espaço de tempo deu forma gráfica e estética à beleza iconográfica da Revolução - ao sonho, ao PREC no Alentejo. 

Um abraço fraterno ao Madeira Luís, que disponibilizou cartazes do seu espólio (colecção homónima da Universidade de Aveiro), ao Centro de Documentação 25 de Abril - Universidade de Coimbra (à Directora Natércia Coimbra) e especialmente ao Arquivo Municipal de Montemor-o-Novo (à Idalete Lebre), Associação José Afonso (à Helena Carmo) e ao Avante! (à Inês Seixas e ao Sueca).
A gratidão pela disponibilidade e apoio aos amigos do Município, interlocutores fraternos e disponíveis: sobretudo a Elvira (Biblioteca Municipal Almeida Faria), Luís Ferreira e João Marques (Pelouro da Cultura), Idalete (Arquivo), assim como o Giga, a Rosa e todos os outros que participaram.
A todos os amigos que disponibilizaram fotos, discos em vinil, entrevistas, ideias... a todos, muitos, muitas... que contribuiram.
E às palavras, inscritas nos painéis, do Carlos, do Gingão, das Mulheres Montemorenses da Resistência (Lizete Pinto de Sá, Mariana Besuga e Florinda Anes) e aos rostos e aos gestos da Reforma Agrária.

E o desenho (a cabeça da camponesa) do Fonte Santa e o sobreiro do Manel Casa Branca.

E os poemas do Ary e da Maria.


Hoje, 168 horas depois
Sempre
A POESIA ESTÁ NA RUA!



15 de mar. de 2010

Maré Alta



Aprende a nadar, companheiro
aprende a nadar, companheiro
Que a maré se vai levantar
que a maré se vai levantar
Que a liberdade está a passar por aqui
que a liberdade está a passar por aqui
que a liberdade está a passar
por aqui
Maré alta
Maré alta
Maré alta
                        
                   Sérgio Godinho

        

9 de mar. de 2010

A Primavera no corpo duma Mulher (8 de Março)


Parto de Baja, (a Baja do século XI, mil anos depois) a cidade mais bonita, a minha primeira cidade de Alentejano campaniço, cidade de recantos oblíquos e pedras milenares cravejadas de cheiros e sabores e silêncios, onde se adivinham paixões eternas quando deixamos o Convento de Nª Sª da Conceição e de Mariana Alcoforada e percorremos a subtil Praça da Repúbica - onde em breve as sinuosas e delicadas árvores irão derramar as suas suaves flores de tília sobre os forasteiros e os viajantes em busca da eternidade…

Percorro uma a uma todas flores como o corpo de uma mulher, com a ponta de língua buscando os secretos segredos de todas as enseadas; percorro sôfrego de desejo o corpo de mil mulheres numa só, Cidade, Mulher, Princesa de Planície, venerada, entre as duas cidades femininas de milenares pedras inscritas de amores secretos e quase proibidos, de amantes apaixonados, histórias nas pedras inscritas. Atravesso Évora em correria num dia de tempestade e quando chego a Extremoz e me dirijo para o tabernáculo, para as talhas inscrustadas, encontro o Mestre Omar Khayyam compondo as suas persas – tão longínquos e tão actuais - robaiyats sobre o vinho, o escanção, a taberna, a bem-amada. O vinho, que significado o amado, amado do Amor ou Amante do Amor.




E depois de uma longa viagem por sobre um Guadiana revolto e ondulado (dança tão igual à do Arade em Silves no dia do encontro de Almutâmide com Itimade), e do alegre convívio em VillaFranca de los Barros (Cáceres) na Expósición Internacional de Arte Contemporáneo, com os pintores M. Casa Branca, a Felícia, a Alice e outros amigos.














Mais tarde numa viagem nocturno pela sublime Mãe-Natureza, ali para os lados do Ciborro, deparo-me com seis pequenos espantados coelhinhos, que afago com o olhar, contente de no meu olhar não ir um predador - daqueles que involuiram muitos milhares de anos (desde o Homo sapiens sapiens) - e fazem do seu poder a barbárie do poder do fogo e da morte. E, já perto de Montemaior, de repente o Sol irrompe poderoso, de súbito é dia luminoso e resplandescente, iluminando todos(as) que anseiam, com sede de infinito,  pelos campos floridos, privadas (os), da sua luz e do seu calor. Sinto então  chegada da Primavera, Mulher, nome de Mulher, Corpo, cheiro, sabor, olhar enigmático feminino, amada, adorada, como no poema de Florbela, como em todos os dias 8 de Março, sempre em cada dia primaveril ou não, no Universo.







Primavera






É Primavera agora, meu Amor!


O campo despe a veste de estamenha;


Não há árvore nenhuma que não tenha


O coração aberta, todo em flor!






Ah! Deixa-te vogar, calmo, ao sabor


Da vida … não há bem que nos não venha


Dum mal que o nosso orgulho que em vão desdenha!


Não há bem que não possa ser melhor!






Também despi meu triste burel pardo,


E agora cheiro a rosmaninho e a nardo


E ando agora tonta, à tua espera …




Pus rosas cor-de-rosa em meus cabelos …


Parecem um rosal! Vem desprendê-los!


Meu Amor, meu Amor, é Primavera!...









Florbela Espanca